terça-feira, 4 de novembro de 2014

todo mundo se pergunta um dia o que quer da vida. todo mundo tem planos, todo mundo sonha. eu costumava sonhar também. ficava imaginando castelos erguidos numa contra luz francesa, bicicletas que nunca aprendi a andar cortando o frio em pontes holandesas ou até mesmo casinhas brancas reluzindo ao sol nordestino sob a voz de Caetano embalando minha alegria. 
pensava que todos eles se realizariam num passe de mágica, que a vida fosse mais fácil do que os poucos choques de realidade que era submetida.
pensava que a felicidade ficava mais perto.
e hoje, do alto do medo de sujar o sofá ou da inabilidade de enxergar a delicadeza cercada de tanta ignorância e maldade eu ainda não desisto, não me permito admitir a derrota, a casa suja, os papéis empilhados, o pé preto, a louça caída, os panos de vômito.
do alto do mais complet(x)o vazio ainda procuro. 
talvez eu ainda me ache.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

primeiro, o horror em perder.
estavam todos os meus documentos lá, no teto quente e sujo daquele prédio que nunca gostei.
dentro do ônibus e o coração na boca. os pés cumpriam a função de se cansar, a cabeça no meio do viaduto lotado de uma cidade em silêncio.
apertei os dentes e tentei alcançá-los.
faltavam letras no título de eleitor, a metade da foto no rg, o ano de nascimento no cpf.
acordei assustada, nunca lembro de sonhos, porque esse?
voltei com menos respostas, mãos mais suadas e bruxismo mais apurado. 

quinta-feira, 2 de maio de 2013

minha vó descrente da vida disse que ingratidão mata paixão, 
disse que aprendeu com a sua mãe,
eu disse que aprendi antes que a minha me ensinasse.
quem cala, sente.

quinta-feira, 25 de abril de 2013

um quarto, uma inteira.

entrei lá sem amor, mas toda orgulho. a cama no chão, a meia luz, a estante torta de livros sem capa, a confusão e a confissão de um amor surdo e cego em cima de um baú. nunca me senti tão em casa, por isso corri.
voltei alguns anos depois e a cama ficou menor, a estante mais suja, o mesmo baú, a confusão de sempre. pensei nas sobras da vida, nas aflições desnecessárias, de qualquer forma não desgrudava os olhos das duas janelas 'uns com tanto outros só com basculante', ri feliz de aguar uma terra tão seca.
pela segunda vez entrei lá, e dessa vez toda amor. as duas janelas ainda me encantavam, o desenho era meu, o sossego também, o baú ficou vazio, a cama cheia. nunca me vi tão feliz.

quarta-feira, 13 de junho de 2012

tirou a roupa, deixou a mala, cortou o cabelo, virou as costas, blasfemou deus, ignorou a psicologia, a auto ajuda, a ajuda alheia, e o caralho a quatro.
e ele?
vestiu a roupa nela, despachou a mala pra bem longe, achou uma de cabelo grande, deu-lhe as costas, acredita em coisas vagas, se calou de morte.

e naquela tristeza nada contida, nada consentida, muito menos calada ela sabe como se torturar e tentar inventar que ele ainda pensa nela, só pra ver se arreda o caminhão que lhe aperta o peito.
quando a angústia não coça e o desespero não arde, ela se dá conta que a solução é molhar os pés no mar e entregar a cabeça pro céu.

quarta-feira, 16 de maio de 2012


ando vendo a vida de fora e nada nela me comove, tão mesquinha, muitos pra quês, sem muitos porquês. cinicamente olhos os movimentos circulares circenses a que meu personagem de olhos fracos é obrigado a executar. 
um palhaço de circo falido e malabares desbotados. uma bailarina rasgada, olhos borrados e coque desfeito chora
descontrolada
               mente
                          sorrindo.
       

domingo, 6 de maio de 2012

numa onda de coisas findas tento inventar novidades, dessas velhas, dessas pequenas pra ver se passa o tempo ou mata o mosquito que ronda essa cesta de mangas.
nessa falta de comoção generalizada, te olho com o mais profundo nada que já nem me pertence mais.
desacredito e desapaixono, obrigação de não sofrer.
me orgulho de sustentar uma palavra firme, condição de sobrevivência de um coração mole.

morta?
de quê?
de ausência e silêncio. 
guardei meu amor numa caixa, dentro de uma mala atravessando o oceano e ela se extraviou, só chegou metade de tudo, até de mim. vou voltar pra buscar, talvez te ache com meu pedaço e o jogue pro Tejo, pra dar sorte.
fazendo odes aos corações ao mar, esse passou tão longe que ainda não teve tempo de se afogar.
que flutuasse num céu de abril, com diamantes comestíveis.